
Utilizo muitas vezes esta divisão para catalogar as pessoas. Fico sempre de pé atrás de quem não gosta do Woody Allen. Por mais espirituosos, inteligentes e simpáticos que sejam, se não gostam do WA é porque há qualquer coisa de errado nelas.
Passo um cheque em branco (artisticamente falando) a tudo o que tenha a sua assinatura. Mesmo as coisas sérias.
Como argumentista é imbatível. Os seus filmes valem principalmente pelo conteúdo, ao contrário da maioria do cinema americano que vale pela forma, pelos efeitos especiais e pelo show off visual. Não precisa de aviões a explodirem ou de tipos em chamas a atirarem-se de helicópteros. Bastam-lhe duas personagens à conversa num sofá.
A grande maioria dos americanos pertence à parte que o odeia. Nem é bem odiar, é mais não o perceber. Estão mais interessados nos hamburgueres e no basebol.
Já os europeus e principalmente os franceses (os campeões das neuroses) adoptaram-no como filho pródigo.
O mais fascinante neste judeu, caixa d'óculos, ruivo, sardento, pseudo intelectual, neurótico depressivo, é ter conseguido transformar os seus complexos e traumas em formas de arte. Ele expõe a sua vulnerabilidade, mostra as facetas, que todos temos, mas que normalmente tentamos esconder com a nossa vida. E essas atribulações psicológicas incomodam muita gente que não gosta de se rever no seu estado ridículo mais puro. WA lida com os seus problemas existenciais e com as suas angústias através do humor, os filmes funcionam para ele como uma espécie de catarse.
Aparentemente incompreensível é o sucesso que tem com as mulheres. Não só os seus personagens são mulherengos como na vida real são conhecidos os casos e casamentos com mulheres extraordinárias. De onde se conclui que quem as faça rir consegue levá-las para a cama.
No seu universo é difícil perceber onde acaba a ficção e começa a realidade. É tão genuíno que nem parece estar a representar. A sua própria vida parece um enredo de um dos seus argumentos. Os filmes do WA deixam sempre a sua marca e fico contente por saber que há tipos mais deprimentes do que eu.
Espero que dure muitos aninhos, que se inspire no Manuel de Oliveira (só na longevidade) e que continue a fazer muitos filmes. Pelo menos uma parte da humanidade agradece.
Em relação à caricatura, acabadinha de sair do forno de propósito para este blogue, é a primeira de uma série de restauros que pretendo fazer à bonecada publicada na revista MAGAZINE - Grande Informação. Enquanto estou de molho (sem guarida para publicar), aproveito para refazer os desenhos que acho estarem menos conseguidos (praticamente todos).
Não sei como se passa com os outros caricaturistas, mas eu tenho vergonha de alguns trabalhos mais antigos e ainda mais vergonha tenho do facto de algum dia os ter achado bem feitos.
A caricatura original, feita a guache, que saiu na revista, juntamente com o texto de cima, já passou do prazo. Muito estática, pouco expressiva, nada de novo trouxe ao mundo. Não ouso apresentá-la aqui. Mostro só esta versão melhorada.

E dessa conversa saiu esta versão.